Fifa- Mundial de Clubes – 2012
Cássio, valeu a espera
Afinal, o goleiro vinha de quatro temporadas bem discretas na Holanda, com pouquíssima rodagem em campo: apenas algumas partidas por PSV Eindhoven. Estava passando batido aos 24 anos, numa sequência pouco animadora para uma carreira que havia começado no Grêmio e incluído uma boa participação na Copa do Mundo Sub-20 da FIFA 2007.
Quatro meses depois, porém, já não havia mais nada de anônimo rodeando este gaúcho de 1,95 m de altura. Tudo por causa, principalmente, de uma defesa. Um sutil resvalo na bola com sua mão esquerda, no jogo de volta contra o Vasco, pelas quartas de final da Libertadores. O suficiente para desviá-la de rumo, poupar sua torcida de mais um trauma e dar o respaldo para Cássio dizer que estava, sim, preparado. E, a partir dali, era, sim, o titular doCorinthians.
“Depois disso foi muito engraçado. Os corintianos vinham me agradecer e alguns queriam até beijar a mão. Outros queriam tirar foto, mas desde que eu mostrasse a mão esquerda”, lembra Cássio aoFIFA.com, sorrindo. “Quando fiz a defesa, parecia que era um gol. Aquele jogo foi a chave para o time vencer a Libertadores. Foi o duelo mais equilibrado. Era como um jogo de xadrez, em que ninguém podia errar. Se tomasse o gol naquele momento, acho que o time não conseguiria virar. Teria muito pouco tempo para empatar e virar. Então eu tinha de estar focado e preparado para tudo.”
A defesa
No jogo de ida, um 0 a 0 no Rio. O placar se replicava em São Paulo quando, aos 17 do segundo tempo, o goleiro Fernando Prass subiu com firmeza para afastar o cruzamento corintiano, e o rebote caiu nos pés de Alessandro, o último homem na linha defensiva. O lateral fez o domínio na intermediária e tentou outro levantamento. Quando viu, acertou o vascaíno Diego Souza, permitindo um contra-ataque aparentemente fatal. O meia arrancou com a bola por mais de meio campo, sozinho, até chegar à área de Cássio.
O que passou pela cabeça do goleiro num lance desses, que parecia aterrorizante para os 30 mil corintianos presentes no Pacaembu, se segurando em sua posição, para não correr o risco de ser driblado e deixado para trás com o gol vazio? “Num primeiro momento, pensei em sair com tudo. A bola espirrou e ficou meio longa. Mas aí pensei que talvez não desse tempo e esperei. Ele vinha muito rápido. Vi que estava bem posicionado e tive o momento de felicidade”, recorda. “É algo que me ajuda bastante: fico muito focado. Mesmo que a torcida do Corinthians seja muito forte, que apoie e cante muito durante o jogo, estava preparado para fazer a defesa.”
Mudança de hábito
Ficar de prontidão, concentrado, nem sempre foi fácil. Contratado pelo PSV no final de 2007, Cássio nunca teve uma sequência de partidas pelo clube. Na temporada 2008-2009, ainda foi emprestado para o Sparta Roterdã, onde conseguiu jogar com regularidade. Mas a volta a Eindhoven significou também um retorno para a reserva. “Claro que na Holanda houve tempos em que pensei: será que eu sou bom mesmo?”, afirma. “Eu me perguntava se era falta de sorte ou coisa parecida. Até perguntei para o técnico o porquê de eu não ter tido chances. Até hoje estou esperando a resposta.”
O goleiro conta, então, que em sua última temporada, ciente de que dificilmente o panorama iria se alterar, decidiu mudar o foco. “Na reta final antes de vir embora, vi que tinha de começar a trabalhar por mim. Deveria trabalhar a cabeça e mais ainda a parte técnica. Lá é pouco treino, só uma vez por dia, então eu ia para a academia do prédio onde morava e fazia uma carga extra. Só queria estar pronto.”
Seu teste para valer só viria muitos meses depois. Mas essa fase de treinamentos árduos deu ao arqueiro a confiança de propor a rescisão contratual com o PSV e acertar logo em seguida com oCorinthians, não necessariamente o lugar mais fácil para buscar um recomeço.
Um segredo
Aliás, ao fechar um pré-contrato assinado com o clube paulista, Cássio teve de encarar outro período de espera. Como o time estava envolvido na disputa pelo título do Brasileirão, para evitar qualquer distração extracampo, a diretoria exigiu sigilo absoluto por parte de seu novo reforço. “A única coisa que não podia acontecer era vazar. Foram cerca de dois meses assim, e era difícil segurar. Não contei nem para a minha mãe. Era engraçado quando encontrava meus amigos, que fizeram até um bolão, mas eu tive de aguentar e consegui.”
Em janeiro ele foi apresentado, mas isso não queria dizer que o campo era só seu. Cássio teve de manter o ritmo dos treinamento de Eindhoven – algo notado e que pegou bem com a comissão técnica, já que não diminuía a dedicação, mesmo sendo ignorado nas escalações.
Cássio conseguiu a vaga após a eliminação da equipe no Campeonato Paulista. O detalhe: sua promoção aconteceria logo no início dos mata-matas da Libertadores. Pressão? “Estava muito confiante, treinando muito bem, física e tecnicamente. Muitos achavam que era uma furada, por assim dizer. A cobrança seria grande, e eu sabia disso, mas estava preparado”, afirma. Em oito jogos no torneio, o goleiro sofreu apenas dois gols, ajudou a tornar ainda mais forte a defesa menos vazada da Libertadores e entrou na lista de candidatos ao gol da Seleção. “O grupo aqui ajuda muito, e eles sempre me passaram muita confiança. Um faz o trabalho do outro.”
Conquistada a Libertadores e aliviada a situação do time no Brasileirão, o técnico Tite começou a planejar a dosagem de minutos de alguns de seus campeões, para tê-los no ponto para a Copa do Mundo de Clubes da FIFA Japão 2012. Considerando sua trajetória, não é surpresa alguma o goleiro ter pedido ao comandante que o excluísse desse rodízio.
“Tinha conversado com ele sobre isso, até por não ter jogado muito. Talvez desse para conciliar, mas sem ficar fora do time”, diz o goleiro, doido para seguir em campo, mesmo que isso signifique levar mais gols, enquanto o Japão não chega. “Não gosto de tomar gol, mas é importante para meu crescimento.” De folga e de tempo parado, afinal, Cássio já está farto. E não é agora que alguém vai duvidar que ele sabe o que é preciso fazer para crescer na carreira.
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