Jul 15, 2014

Somente os clubes e o governo podem mudar o futebol. CBF e Federações serão contra.

A terrível derrota do futebol brasileiro na Copa deste ano abriu o debate sobre a necessidade de mudanças modernizadoras em nosso principal esporte.

A Copa (que todos diziam seria ruim na infraestrutura, transportes e na segurança) surpreendeu todo mundo. Quase tudo funcionou bem. Estádios prontos, transporte adequado (com metrô e trem funcionando bem) e segurança à altura do evento.

Dentro de campo é que o time brasileiro foi um desastre. Não jogou bem em nenhuma partida, mostrou descontrole emocional e levou duas goleadas que levarão anos para serem esquecidas.

Foi uma derrota total: esportiva, tática e de preparação física. A saída de fazer um bom trabalho “no emocional” -papo frequente dos boleiros- foi para o ralo. Sem jogadores talentosos não há garra, hino ou choro que salve. A geração de 2014 é fraca. São quase só jogares médios (alguns menos que isso) que até deu susto nos estrangeiros que por aqui vieram.

O trabalho de reconstrução será será duro, difícil e demorado. Algum tempo (talvez décadas) passarão para o Brasil voltar a produzir grandes jogadores.

Para isso é preciso mudanças. E muitas idéias temos por aí.

A CBF e Federações não mudam nada

Será difícil que qualquer mudança inicie-se nas entidades superiores de nosso futebol. Apenas  duas vezes, em mais de 50 anos, lembro-me de qualquer medida delas que mudaram o futebol. A instituição dos campeonatos por pontos corrido e a organização da Copa de 58, quando terceirizou para um grupo de São Paulo a preparação da Copa. No mais, o que querem a CBF e Federações é manter tudo como está.

A Lei Pelé não é culpada de nada

Frequentemente aparecem artigos acusando a Lei Pelé de ter “estragado” com o futebol brasileiro. A lei teria acabado com o” passe” e com isso os clubes não puderam mais revelar jogadores. Não é verdade. O fim do passe veio por imposição externa. A Comunidade Econômica Européia obrigou (é isso mesmo!) e meteu goela abaixo da Fifa o fim dos vínculo de um jogador após o vencimento do contrato. A Fifa resistiu o que pôde, mas rendeu-se no fim.

À partir disso, todos os países tiveram que mudar suas leis de forma que o contrato entre jogador e clube seria o mantenedor do vínculo. Encerrado o prazo, todos seriam livres.

Foram criados multas que “garantem” o contrato e indenizam os clubes.

Infelizmente, no Brasil, a Justiça do Trabalho passou a “flexibilizar” os rompimentos de contrato. Nos outros países, onde não há Justiça do Trabalho nos moldes da nossa, é sempre mais difícil haver esses rompimentos. A Lei Pelé não criou nada, e sim aceitou o que a Fifa determinava.

A Fifa proíbe o Estado no futebol

Outro equívoco frequentemente divulgado é de que a Fifa não aceita “ingerência” do Estado no futebol. Não é o que ocorre. Em quase todos os países, a organização do futebol -e dos demais esportes- é regulada por leis dos Estados.

O Estado pode -e até deve- regular de forma adequada seus esportes. O Supremo Tribunal Federal já decidiu isso. A autonomia na organização dos esportes não é soberania e os Estados podem estabelecer normas organizadoras.

 Mudanças na legislação dos futebol

Muitas ideias surgiram neste momento de dor e derrota de nosso futebol. Algumas delas são boas.

Vejamos algumas:

CBF:  Na maioria dos países a direção da Confederação de Futebol é sempre eleita pelos clubes das primeiras, segundas e até terceira divisão. No Brasil, foi criado um sistema de federações estaduais (todas não reconhecidas pela Fifa) que concentram o poder político de escolher a direção nacional.

Nada impede que, em uma reforma legal, seja prevista a eleição da direção da CBF pelos clubes da primeira e segunda divisão. Essa situação faz mais sentido e dá mais mais ligação entre os clubes e a organização do futebol do que essas direções formadas à margem dos times.

O fim da reeleição ou apenas uma repetição de mandato também é uma mudança mais do que necessária nas entidades que organizam o futebol e os demais esportes brasileiros.

A transparências nas contas, com auditorias regulares e normas públicas estabelecidas e verificadas por uma Agências dos Esportes, nos moldes das demais agências reguladoras, também é uma ideia a ser discutida.

Esta proposta de uma agência não afasta as críticas que as atuais agências recebem pelo seu deficiente trabalho.

Clubes: A Agência reguladora do futebol trataria de impor normas que garantam a regularidade fiscal dos clubes e entidades. Este é um bom exemplo do futebol alemão, onde os clubes devem ter uma “sadia” gestão financeira sob pena de punição dos dirigentes e afastamento dos próprios times dos campeonatos.

Essa anarquia de gestão diminuiria muito se uma lei de responsabilidade fiscal fosse trazida para o esporte. Fim de reeleição dos dirigentes e gestão transparente seria importante para o futebol e demais esportes. Vários clubes já deram alguns passos nesse sentido (o Corinthians é um deles), e os resultados são positivos.

Categorias de Base: O completo desastre nas categorias de base dos clubes reduziu -drasticamente- a revelação de novos jogadores.  Esta área é fundamental para que o futebol brasileiro volte a ter uma posição de destaque.

O governo federal já vem apoiando os clubes nas construções de Centros de Treinamento para formação de novos craques. As isenções fiscais que apoiam estas obras vêm sendo de grande importância para os clubes nos últimos anos. Corinthians, São Paulo e outros mais têm construído seus Centros de Treinamento com apoio dessas isenções. É preciso que os clubes mudem sua politica nas categorias de base. Não há qualquer sentido em formar jogadores “em parcerias” com empresários que, na prática, tornam-se donos dos jogadores e procuram levá-los para a Europa de maneira cada vez mais precoce.

O governo poderia vincular o apoio financeiro que dá aos clubes a uma política que forme atletas para a disputas em competições no Brasil,  proporcionando a formação de craques com nossas caraterísticas.

Lei de Responsabilidade na gestão esportiva: Torna-se medida de urgência aprovar uma legislação que cobre dos clubes e de federações transparência nas suas finanças. A situação -sempre repetida- de clubes construírem grandes dividas (muitas das quais por não pagarem impostos e salários) há que ser resolvida.

Uma Agência Reguladora do Futebol -criada pelo governo- poderia ser um importante instrumento para uma gestão responsável. Os clubes e dirigentes que agirem de forma danosa devem ser punidos de forma a garantir uma competição desportiva saudável.

Entidade sem alternância de poder não receberão recursos públicos:  A perpetuação de dirigentes  em clubes e entidades já se mostrou danosa para o esporte. O governo deveria condicionar o acesso a verbas a entidades que estabelecessem a alternância de seus dirigentes. O mesmo deveria ocorrer para o refinanciamento de dívidas (inclusive tributária).

Quem não se organizar de forma democrática e com transparência de gestão não deve ter qualquer vantagem fiscal ou financeira, simplesmente porque a atual situação não faz nenhum sentido.

Estas são algumas propostas que visam mudar o quadro do futebol brasileiro. Esperemos que a dura derrota desta Copa seja um motivo para reformas que abram um novo horizonte no futebol. Sem mudança vamos caminhar para novas e vexatórias derrotas.

18 Comments

  • Por favor Citadini, deixe o governo de fora! Mesmo que a FIFA permita, é uma péssima ideia aqui no Brasil. Imagine fazerem com o Corinthians o que estão fazendo com a Petrobrás.

    “e a organização da Copa de 58, quando terceirizou para um grupo de São Paulo a preparação da Copa. No mais, o que querem a CBF e Federações é manter tudo como está.”
    Não gosto nem um pouco da CBF, por vários motivos, mas mesmo assim sou obrigado a perguntar:
    Deixemos 58 de lado. Em que setor os nossos governos conseguiram nos colocar 4 vezes como o melhor do mundo?

  • “Infelizmente, no Brasil, a Justiça do Trabalho passou a “flexibilizar” os rompimentos de contrato. Nos outros países, onde não há Justiça do Trabalho nos moldes da nossa, é sempre mais difícil haver esses rompimentos.”
    Veja o que dá o governo se meter. Xeque-mate!

    Minha imaginação não chega aos pés das dos “nossos” governantes, mas mesmo assim consigo pensar em algumas da medidas geniais que eles tomariam:
    – cotas nos times
    – igualdade na participação dos estados no Brasileirão
    – emissão de liminares se for assinalado um penalti duvidoso com a paralisação da partida

    Para quem acha que eu exagero, duas palavras: Pasadena e Mensalão

    • Sr. Mário; como assim a “flexibilização” dos contratos é exemplo da ingerência do “governo” nas questões do futebol? Até onde sei a Justiça do Trabalho faz parte do Poder Judiciário, um dos poderes da República, mas não se confunde com o “governo” – ou Poder Executivo! Um pouco de critério é bom para tratar desses (e outros) assuntos.

      • Você tem razão altamir, mas eu acho que nenhum dos três poderes tem que se meter.É claro que isso não quer dizer que clubes e federações podem fazer o que quiser, mas achar que um atleta profissional é igual a um operário é absurdo, querer que todas as leis trabalhistas se apliquem a ele mais ainda.
        Exemplo de loucura: “O juiz Rogério Neiva Pinheiro, da Primeira Vara do Trabalho de Brasília, decidiu sobre as paradas técnicas nos jogos da Copa do Mundo. A pedido do Ministério Público do Trabalho, a decisão em caráter liminar determina paradas para reidratação dos jogadores sempre que a temperatura chegar a 32ºC. As interrupções deverão ser feitas aos 30 minutos de cada tempo. Caso a Fifa descumpra a ordem, a entidade será multada em R$ 200 mil por jogo.”

        • E além do mais essa decisão ainda era (se não me engano) menos efetiva que a própria indicação da FIFA para a parada técnica.

  • Governo tem que administrar o estado…os serviços a população…a economia (em partes)…o desenvolvimento…

    já não conseguem fazer o mínimo e agora querem se meter no futebol???

    Acho a CBF uma m…. mas o governo querer botar o dedo lá não mudará nada…pelo contrário….em breve o Mensalão do Futebol

  • Fico pensando por onde começaria essa mudança e sempre esbarro na política. A Dilma parece (parece…não tenho certeza) que quer fazer algo. Mas tem a bancada da bola. Numa canetada ela poderia tentar mudar, mas certamente sofreria ataques (chantagens) dessa bancada…Ela seguiria adiante? O Aldo Rabelo compraria essa briga? Eu não sei…Tenho sérias dúvidas. Teria de mudar tudo nas federações e por consequência na CBF…Tem presidentes com 10…30…30…40anos NO PODER! Esses caras não vão largar esse filé sem dar tiro para todos os lados! E aí entram os CLUBES… Todos também com rabos presos em empréstimos e devendo mundos e fundos para o GOVERNO FEDERAL. Fechou o círculo. Não tem jeito…se o governo federal tiver SANGUE NOS OLHOS e realmente quiser mudar, FORÇANDO a situação em cima dos clubes e das Federações a coisa muda. Se não…vai ser dificil…

    • “se o governo federal tiver SANGUE NOS OLHOS e realmente quiser mudar, FORÇANDO a situação em cima dos clubes e das Federações a coisa muda.” Só que mudaria para pior Haroldo, MUITO pior

      • É, pode ser Mário…Mas algo tem de ser feito. E revendo o que li, lembrei um fator que, se quiser muda TUDO MESMO. O fator GLOBO. Será que não é por aí?

        • A Globo, se sair, aí que os clubes fecham as portas.
          O cancer está nos empresários donos de jogadores, mais ricos dom que clubes.
          Mas parece que nisso, nem o Bom Senso tem aquilom roxo prá mexer.
          O lobby dos caras deve ser poderoso mesmo, porque até a imprensa nem passa perto de questionar isso. Preferem bater em dirigente, na maioria das vezes um apaixonado,.
          Eu acho que esses interessados (intermediários) mandam na cocada.

        • “O fator GLOBO. Será que não é por aí?”
          No mínimo seria um bom começo.

  • Citadini, concordo integralmente com as suas sugestões. Passou a hora do governo federal entrar para valer e modificar a atual estrutura no nosso esporte em geral. A maior conquista do Corinthians nos últimos anos, não foi a Libertadores ou o 2º Campeonato Mundial, mas a mudança do estatuto do clube, não permitindo a reeleição. Também tem que mudar no nosso país a mídia em geral. Não dá para mensurar o grande prejuízo causado pela mídia, ao vender a imagem que a Copa seria um grande fracasso e que os turistas, que por aqui aventurassem correriam sérios riscos. Comprovou-se que era mais torcida para que isso ocorresse. Pois bem: a mídia esportiva vendeu a imagem que a nossa seleção era imbatível e que ganharia com o pé nas costas o HEXA. o que aconteceu? Alguns tiveram a hombridade de reconhecerem o erro. Queremos que o Art. 5º da Constituição Federal, inciso V – É ASSEGURADO O DIREITO DE RESPOSTA…., seja implantado imediatamente, com a nova regulamentação da Lei de Imprensa, pois hoje vivemos no regime de ditadura da mídia, quer perante ao Brasil, e/ou ao nosso querido Corinthians.

    • ” Passou a hora do governo federal entrar para valer e modificar a atual estrutura no nosso esporte em geral.”
      Acho que modificaria para muito pior Yglesias. Por que você pensa que seria para melhor?
      “pois hoje vivemos no regime de ditadura da mídia,”
      Não é verdade, muito longe disso. Mídias existem centenas, milhares, governo é um só. Se o PT conseguir realizar seu velho sonho, o do controle da mídia, aí sim você vai descobrir o que é ditadura.

  • Os empresários se divertem com as categorias de base…

  • Citadini. Há um grande equivoco aí nesse post. Como que essa lei não precisa ser revista?
    Você poderia explicar, como pode um Tribunal do Trabalho, condenar um clube de futebol em questões trabalhistas, no caso de um jogador, onde o clube tem 20% dos seus direitos, e o restante fatiado entre empresários, absolutamento inimputáveis por essa legislação medíocre que entregou tudo a pessoas juridicas, físicas, e até supermercados e Bancos?
    Me desculpe. É numa pouca vergonha nada se exigir dos ‘DONOS” dos jogadores, e jogarem tudo sobre as costas dos clubes.
    Nas vendas, estes ficam com migalhas, quando não ficam com nada, e isso está certo?
    Onde já se viu, exigir que os clubes “EVOLUAM” na produção de jogadores, quando esses ainda na incubadora, são apenas mercadorias para engorda nas agremiações?
    Isso é a maio aberração que está matando os clubes, e enriquecendo investidores.
    Defender essa situação, é ficar do lado errado da história, é proteger, os DISES, BMGs, WAGNERs, da vida.
    Deveriamos ficar do lado de cá , dos clubes e acabar com essa mamata criada ´para investidores, que ficam com o filé, e deixam os ossos para os clubes de futebol, falindo.

  • Citadini, depois da lei Pelé a moeda passou a ter somente um lado, é um equivoco seu quando afirma que tal lei não é culpada de nada. Tem outros motivos ,As pessoas que vivem no meio do futebol sabem quais, agora não podemos isentar a lei Pelé.

    A verdade é que os clubes brasileiros, com a anuência de maus dirigentes, servem de vitrine para exposição de jogadores que possuem ligação com empresário. Os contratos são por longo prazo, com altos salários. Se o jogador for bem é vendido imediatamente mesmo com contrato vigente, ah! o clube que se dane. Os argumentos são sempre os mesmos. Não podemos segurar o atleta que não esta contente, pois quando o mesmo que sair não tem com segurá-lo. Pois bem , vende-se o atleta. O clube fica com 20% e o empresário com o restante.
    Se o jogador for dispensado antes do contrato terminar. Prejuízo com certeza, pois a parte que se julga prejudicada vai pleitear seus direitos na justiça trabalhista e o resultado final todos nos já sabemos.

    .

  • Concordo com alguns, o governo não deve se meter, mas ao meu ver deveria proibir de divulgar o nome Seleção Brasileira, se querem fazer a farra, que seja com grana privada e sem levar o nome do país para a lama… deveria ser a Seleção da CBF… posição radical, mas digna… também deveria cobrar com juros de mercado as dividas com a união que os clubes possuem, assim a água iria bater na bunda e o mercado do futebol iria se regular de maneira natural… claro que no país das negociatas isso nunca aconteceria, mas seria um excelente caminho…

    Outra coisa, nesse caso a cambada de sem vergonha de presidentes e diretores dos clubes, os corruptos é claro, se é que existe diretor não corrupto no futebol profissional,iria andar mansinhos mansinhos… mas como já disse, doce ilusão…. opa, o leonardo já chegou jundo com o del nero, agora vai……kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

  • Marin, Gilmar Rinaldi… É o tricolinho dando o ar da graça!

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