Uma bela vitória
Após vitória, Mano responde a críticos, desabafa e cutuca Felipão
Mano Menezes, 52, vem do Rio Grande do Sul. Estado onde, ele mesmo reconhece, as pessoas têm o hábito de escutar rádio esportivo. O técnico do Corinthians não esquece o que é escrito e falado sobre ele. Volta e meia, lança mão da expressão “penso que” para começar uma frase.
Invariavelmente, quando diz isso, é porque já pensou. E Mano tem pensado, mais do que antes, em rebater quem o critica, aqueles que acredita serem os responsáveis por formar a opinião da torcida do Corinthians. Após a vitória sobre o Atlético-MG, nesta quarta (1º), pela Copa do Brasil, o técnico entrou na sala de entrevistas salivando (em sentido figurado) para dar o troco.
A pecha de retranqueiro o incomoda. Desde a saída da seleção brasileira, em 2012, muita coisa o incomoda.
“Ouço desde que cheguei aqui [sobre o defensivismo do Corinthians]. Desde antes de chegar, escuto. O torcedor repete o que vocês [jornalistas] falam. No Rio Grande do Sul se escuta muito rádio esportivo. Uma pessoa me chamou atenção de que o torcedor está no estádio e fica escutando a narração do rádio. Ele está vendo o jogo, mas acredita mais no comentarista do que no jogo que ele está vendo”, ressaltou.
Virou uma relação de gato e rato. A cada derrota, há críticas de que o Corinthians vai pouco à frente, é um time sem força ofensiva. Que se defende mais do que ataca. Quando a equipe ganha, Mano dá a resposta. Como fez após a vitória por 2 a 0 sobre o adversário mineiro.
Com o resultado favorável, ele descarrega. Há semanas escuta que pode ser trocado por Tite. Que poderia deixar o Corinthians na próxima temporada. Que não seria o técnico favorito de Roberto de Andrade, provável candidato da situação à presidência do clube. As eleições estão marcadas para fevereiro de 2015. Como escuta, vê e lê, Mano sabe perfeitamente de tudo isso.
Na sala de conferência de imprensa do Itaquerão, ele lembrou que precisa se reunir com a diretoria após a temporada e ver se a continuidade interessa às duas partes. O 2 a 0 sobre o Atlético abriu a possibilidade de chegar à semifinal do torneio. Ficaria a apenas quatro jogos do título e da vaga na Libertadores.
O recado de Mano Menezes é simples. Não basta ver se o Corinthians o quer. É preciso ver se ele também quer o Corinthians.
Tudo é uma via de mão dupla. O chavão é que no futebol se vive de resultados. Para Mano Menezes, são os resultados que lhe dão as armas para a revanche.
As afirmações, ironias e respostas do técnico precisam ser lidas sempre nas entrelinhas. “Eu sou um sujeito que guarda as coisas. Não extravaso”, reconheceu.
Menos quando viu Luciano empurrando a bola para o gol vazio. Foi o segundo do Corinthians nesta quarta. Lance que dobrou a vantagem de sua equipe para jogar em Belo Horizonte, no próximo dia 15. O treinador começou a dançar, braços abertos, em saltos lentos, uma cena que tinha tão pouco a cara de Mano Menezes que espantou a todos.
“Não extrapolei, não. Sou assim mesmo. Sou autêntico. Não concordo com os que dizem que o Corinthians joga atrás. A gente tem de evoluir, aceitar a normalidade e extravasar um pouco”, completou, tão de bom humor que confessou poder continuar a entrevista coletiva até às “duas da manhã”.
Não é apenas para responder à imprensa, à torcida ou a dirigentes que ele quer o título. Chegou a hora de voltar a ganhar porque, no futebol, só tem razão quem vence. E a seleção ainda é uma ferida aberta para ele.
Não é qualquer um que é privado da chance de comandar a seleção mais vencedora da história do futebol antes de disputar uma Copa do Mundo em casa. Isso sem ter tido nenhum resultado catastrófico para causar sua demissão. Mano Menezes foi vítima dos acontecimentos e da queda da dupla Ricardo Teixeira/Andrés Sanchez do comando da CBF.
Isso é difícil da aceitar. Tão difícil que ele não perdeu a chance. Quando ouviu a pergunta que citava Luiz Felipe Scolari e a “turma do amendoim”, os corneteiros da época de Felipão no Palmeiras, sentiu que a bola quicava. Tinha de chutá-la.
“Você citou o nome de um técnico que, em um momento, tentou fazer algo que não dava para fazer. E aí vocês sabem o que aconteceu.”
Pouca diferença fez não ter citado o nome. Em duas frases, Mano o seu sucessor na seleção (aquele sobre o qual paira a suspeita de ter negociado para voltar ao cargo quando Mano ainda estava no comando), a controversa decisão deste em escalar Bernard contra a Alemanha, na semifinal do Mundial, e o vexame histórico do 7 a 1 no Mineirão.
Mano Menezes pensa que, no futebol, só ficam aqueles que conseguem os resultados. E apenas os resultados lhe dão a liberdade para extravasar contra aqueles que ele não ousa dizer o nome.
ALEX SABINO
(Folha de S.Paulo, Esporte, 02-10-14)
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